Cinco ou seis ensaios estereoscópicos à procura de uma narrativa
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O filme
Trata-se de um ensaio audiovisual de alta tecnologia que explora imagens em ultra-definição. Assim como no lendário Vistas da Bahia da Guanabara (1898), dos irmãos Segreto, o Rio de Janeiro é novamente a cidade para onde câmeras pioneiras se dirigem. Com a diferença de que, agora, as “vistas” podem ser observadas em três dimensões e altíssima definição.
O filme é dividido em 5 atos, além de um prólogo e um epílogo. O prólogo e o ato I resgatam mais explicitamente a idéia de “vistas” do Rio de Janeiro, planos do Pão-de-Açúcar, da ponte Rio-Niterói e da Baía de Guanabara, em tomadas aéreas e marítimas. Caminhões, guindastes e navios - todos os elementos em dimensões gigantescas e plenos de movimento. Em 3D, o movimento contínuo das máquinas molda os planos que configuram o espaço estereoscópico. Como disse o estereografista Keith Collea sobre as máquinas: “vejam, elas trabalham para nós!”. Em oposição, os contêineres coloridos e gigantes formam uma cadeia de fundo, fechados em seus segredos sobre os objetos que trazem de regiões distantes.
O ato III explora as ruas labirínticas da comunidade Tavares Bastos e celebra os jogadores locais de futebol. Os pés, a bola, os movimentos fortuitos dos garotos são elementos de composição dos planos que se misturam aos movimentos da dança do ato V. Os pés, as mãos e os movimentos dos bailarinos da Mangueira se integram aos movimentos da bola, em um jogo despretensioso e espontâneo, cujo principal objetivo é promover uma nova experiência visual.
Filme “de projeto”
O filme é parte de um projeto de pesquisa promovido pela RNP (Rede Nacional de Ensino e Pesquisa), cujo objetivo é produzir conteúdos de super-alta definição que possam ser transmitidos por redes fotônicas, geridas pela RNP.
O projeto, desde o seu início, enfrentou os desafios tecnológicos dos grandes laboratórios de pesquisa. Desde o par único de câmeras, equipamento ainda desconhecido dos especialistas, passando pelo processamento de imagens, com cerca de 10 milhões de pixels de definição, até a exibição do filme em projetores especiais, ainda em fase de estabilização. Na projeção estereoscópica do filme (3D), a resolução chega a 20 milhões de pixels por frame na tela, somadas as imagens correspondentes aos olhos esquerdo e direito.
Estereoscopia em novas dimensões
Este experimento remonta aos desafios enfrentados pelos pioneiros do cinema e recupera a fantasia dos aparatos estereoscópicos do século XIX. Em 1891, Edson já tinha a intenção de dar profundidade estereoscópica às imagens do Kinetógrafo que seriam vistas pelo Kinetoscópio. Em 1856, com apenas dois anos de existência, a London Stereoscopic Company chegou a vender meio milhão de visores estereoscópicos. Também na metade do século 19 era inventado, na Polônia, o Fotoplastikon Warszawski (Warsaw Stereoscope / Estereoscópio Varsóvia). Na era dos “pré-cinemas”, a fotografia estereoscópica trazia uma experiência nova de percepção da realidade, oferecendo aos espectadores um novo nível de imersão nas imagens, como se estivessem viajando a lugares remotos e participando pessoalmente de eventos distantes. Vistas estereoscópicas da cidade e outras localidades já eram exibidas ao público em 1905, com a inauguração do Fotoplastikon Warszawski na Al. Jerozolimskie 51, em Varsóvia, o qual pode ser visitado ainda hoje. O Fotoplastikon de Varsóvia é a única atração do gênero que ainda funciona em seu endereço original.
Em 1935, Louis Lumière refez a Chegada do trem à estação (L'arrivée d'un train en gare de La Ciotat, 1895) em versão estereoscópica, remake que talvez tenha sido o verdadeiro responsável pelo famoso espanto com o realismo das imagens que geralmente se atribui à projeção pública de L'arrivée d'un train en gare de La Ciotat, em 1896. Walter Benjamin relata mais de uma vez a sua experiência estereoscópica com o Kaiserpanorama em Berlim em 1900. O pensador alemão comenta o fascínio do público com as fotografias de viagens e usa o estereoscópio como metáfora da nova configuração da modernidade, com imagens “dispostas como se saíssem de gavetas”, cenas e objetos de colorido intenso em oposição a um fundo com fortificações e edifícios opressores, herança czarista na cidade de Riga. Mais tarde, Benjamin chama a atenção para o tempo dos detalhes que as novas cenas tridimensionais exigem, e sugere que o “olhar estereoscópico” deva ser cultivado para o enfrentamento em profundidade das “sombras históricas”.
Toda essa “herança estereoscópica” das imagens fixas e em movimento inspira o projeto de EstereoEnsaios: cenas que nos remetem à historicidade do aparato com “vistas”, o movimento fortuito da natureza, das máquinas e do corpo humano, plenos de sensualidade frente ao dispositivo estereoscópico.
Questões
A visão estereoscópica gerada pelas novas tecnologias de captura em ultradefinição (5K) instiga-nos a pensar em novas possibilidades imagéticas, em novas metáforas para o cinema e num novo patamar de sensações – enfim, toda uma nova aesthesis. O gigantismo das imagens digitais de ultradefinição estão preparadas para um novo escalonamento do olhar.
Se antes tínhamos o “cinema-olho” (no singular), com Dziga Vertov e a centralidade da perspectiva monocular que acompanha a sua história, hoje a imagem estereoscópica permite que se perceba o mundo visual ao nosso redor através de uma “stereopsis”. Em outras palavras, trata-se de um deslocamento da câmara de cinema, cíclope (um só olho), para um olhar de câmeras duplas, estereóptico. Nesse sentido, como pensar em todo um novo mundo das imagens em movimento mecânica e eletronicamente captadas a partir de uma perspectiva binocular? Em termos mais simples e diretos, como filmar e montar um filme tridimensional, narrativamente falando? O que nossos olhos, saturados por mais de 110 anos de imagem em movimento, suportam – e esperam - das imagens revisitadas pela estereoscopia em dimensões colossais? Antes de tudo, a questão-tema de EstereoEnsaios é a seguinte: o 3D é uma linguagem ou um efeito?
As perguntas estão apenas começando.
Estréia: 15/09 às 17h00 para convidados na Cinemateca do MAM no Rio de Janeiro
Equipe resumida
direção
jane de almeida
direção de fotografia
fábio pestana
estereoscopia
keith collea
pesquisa e roteiro
jane de almeida, cicero inacio da silva e alfredo suppia
montagem
andré pupo e alfredo suppia
trilha sonora
lívio tragtenberg
FINALIZAÇÃO CINEPRO | DOT
realização do grupo de trabalho de aplicações avançadas de visualização remota da Rede Nacional de Ensino e Pesquisa – RNP
Contatos:
Cicero Silva (produtor executivo)
11 7315 0035
Jane de Almeida (diretora)
11 9598 0070